CPI já aprovou mais de 60 pedidos de quebra de sigilo; veja os principais nomes
A CPI da Pandemia já autorizou a quebra de sigilo de pelo menos 60 pessoas físicas ou jurídicas, todas envolvidas nas linhas de investigação abertas pela comissão em mais de dois meses de funcionamento.
Entre as autorizações, estão acessos a informações de nomes que integram ou já integraram o alto escalão do governo federal, como os ex-ministros Eduardo Pazuello (Saúde) e Ernesto Araújo (Relações Exteriores), o militar Élcio Franco e o servidor Roberto Dias Ferreira, que ocupavam, respectivamente, a secretaria-executiva e a chefia do Departamento Logística do Ministério da Saúde.
A CPI também já se adiantou à realização de depoimentos e pediu a quebra do sigilo de figuras como Francisco Emerson Maximiano, dono da Precisa Medicamentos — empresa envolvida em suspeitas de contratos superfaturados para a compra da vacina Covaxin. A oitiva do empresário ainda não tem data certa para ocorrer. Os dados relativos à Precisa e a Túlio Silveira, outro representante da empresa, também foram solicitados com antecedência.
Os ministros também colocaram holofotes em figuras que, para a CPI, podem ter informações relevantes sobre as orientações federais para o combate à pandemia. É o caso de ex-assessores do ministro Eduardo Pazuello, como Marcos Eraldo Arnoud, o Markinhos Show, e Zoser Plata Bondim Hardman de Araújo.
“O conteúdo a ser disponibilizado pelo Whatsapp, pelas redes sociais e pelo próprio Ministério quanto ao email funcional que utilizava, serão essenciais para averiguar a realidade dos fatos e confrontá-los com o teor dos depoimentos já prestados e dos documentos também já disponibilizados a esta CPI”, diz o pedido de uma das quebras relacionadas ao núcleo de Pazuello.
“Gabinete paralelo” e fake news na mira
Outro foco dos pedidos de quebra já votados pelos senadores está no funcionamento dos grupos que coordenariam o suposto “gabinete paralelo”, um grupo de fora do Ministério da Saúde que orientava o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em relação a práticas de combate à pandemia.
Além de Mayra Pinheiro, conhecida como “capitã cloroquina” e secretária de Gestão do Trabalho e Educação da mesma pasta – também já ouvida pela comissão -, a CPI quebrou o sigilo de Carlos Wizard Martins, empresário apontado como um possível financiador do grupo, e do médico Paolo Zanotto.
No caso de Pinheiro, por exemplo, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) considerou que a secretária utilizou-se de seu cargo para orientar profissionais da Prefeitura de Manaus a utilizarem cloroquina e ivermectina no tratamento à Covid-19. Os dois medicamentos não têm eficácia comprovada no combate à doença.
Também foram solicitadas informações sobre o tenente-médico Luciano Dias Azevedo, da Marinha, apontado como o militar responsável por pressionar pela mudança na bula da cloroquina — fato relatado no depoimento do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta -, e da Associação Médicos Pela Vida, grupo que teoricamente reuniria médicos favoráveis à utilização de cloroquina e outros medicamentos do chamado “tratamento precoce”.
Na investigação que apura a influências de fake news no combate à pandemia, foram fornecidos aos senadores informações decorrentes da quebra dos sigilos telemático e telefônico de assessores diretos de Jair Bolsonaro – Tercio Arnaud Tomaz, José Matheus Salles Gomes e Mateus Matos Diniz. O movimento também alcançou o blogueiro Allan dos Santos, apoiador do presidente.
Governistas não aprovam quebras
Até o momento, os requerimentos aprovados envolvendo quebra de sigilo bancário, telefônico, fiscal e telemático (de demais meios de comunicação à distância) partiram do relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB-AL), com 20 pedidos; do vice-presidente Randolfe Rodrigues (REDE-AP), com 18 pedidos; e de Alessandro Vieira (Cidadania-SE), membro do bloco Senado Independente, que fez 30 pedidos.
O senador Marcos Rogério (DEM-RO), da base governista na CPI, acredita que os pedidos de quebra de sigilo deveriam ocorrer após esgotarem-se todas as possibilidades de investigação, incluindo as oitivas realizadas no Senado.
“Infelizmente, o que eu observo é que a quebra de sigilo tem servido como propósito de bisbilhotagem na vida pessoal, profissional ou política das pessoas”, afirmou em declaração à CNN. “Isso coloca essas testemunhas em condição de investigado e vai fazer com que os depoentes passem a não falar na CPI”, afirmou.
Já para Alessandro Vieira, todos os pedidos já concluídos trouxeram dados “significativos”, que vão levar ao aprofundamento das investigações, “eventualmente com novas quebras”, mas há dificuldade no processamento da grande quantidade de informações devido à redução da equipe responsável.
Vieira discorda da interpretação de Marcos Rogério e afirma que, em uma CPI, todos os pedidos aprovados decorrem da articulação dos votos da maioria — o que não foi alcançado pela ala governista até o momento.
Na análise da cientista política Deysi Cioccari, é interessante que a CPI solicite a quebra de sigilo antes dos depoimentos para agilizar a checagem de informações. “Os senadores já ficam municiados e não sujeitos às fake news”, analisa.
A falta de contraponto de indicados pelo campo governista, para ela, demonstra a dificuldade do governo em realizar as articulações necessárias para barrar pedidos ou aprovar outros requerimentos.
“A gente tem visto muita polêmica, mas não podemos esquecer que o sistema brasileiro é de freios e contrapesos — o controle do poder pelo próprio poder. A gente entende que as funções dos poderes investigam um ao outro, e isso não é de problema nenhum ainda durante a maior pandemia do século”. (CNN)