Ação que mira Bolsonaro inelegível acelera com prova em vídeo e foco em fala a embaixadores

A ação de inelegibilidade contra Jair Bolsonaro (PL) com andamento mais rápido e apontada como a primeira candidata a ser julgada foi apresentada pelo PDT e tem como foco a reunião com embaixadores protagonizada pelo então presidente em julho do ano passado, na qual ele repetiu teorias da conspiração sobre urnas eletrônicas e promoveu ameaças golpistas.

Das 17 ações que podem tornar Bolsonaro inelegível, 2 têm como alvo principal os ataques ao processo eleitoral e às urnas. Apenas a do PDT, porém, teve um episódio único como foco.

Se for condenado em alguma delas, Bolsonaro não poderá se candidatar por oito anos a contar da data da eleição.

O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) estabeleceu um precedente em 2021 sobre a possibilidade de inelegibilidade por ataques à lisura do processo eleitoral, já no contexto das falas de Bolsonaro ao sistema, quando cassou o mandato do deputado estadual Fernando Francischini devido a uma live em suas redes sociais no dia das eleições de 2018.

Também são apontados como ilícitos pelo PDT o uso do aparato estatal, como o fato de a reunião com embaixadores ter ocorrido no Palácio da Alvorada (residência oficial da Presidência) e de ter sido transmitida pela estatal TV Brasil, que integra a EBC (Agência Brasileira de Comunicação).

Segundo o autor da ação, o então presidente e candidato difundiu a gravação do evento em suas redes com finalidade eleitoral.

“Bolsonaro desvirtuou a realização do ato para propagar seu programa de campanha, que dentre poucas coisas, abarca os ataques à integridade do processo eleitoral como principal sustentáculo de discurso”, diz trecho da peça.

Além de estar restrito a um episódio, a principal prova do processo, o vídeo da reunião, foi entregue por meio de pen drive pelo PDT, que não fez pedidos de produção de provas –o que poderia incluir, por exemplo, a apresentação de documentos por autoridades, quebras de sigilo e perícias.

A defesa de Bolsonaro, por seu lado, pediu apenas para ouvir três testemunhas –inicialmente eram quatro, mas a defesa voltou atrás quanto a um dos nomes.

“Nós não pedimos nada para fazer provas, eles apresentaram três testemunhas, que já foram ouvidas, então só precisa agora da votação”, diz Walber Agra, advogado que assina a ação do PDT.

Durante a reunião com os embaixadores, Bolsonaro desacreditou o sistema eleitoral e atacou ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).

O teor das falas de Bolsonaro não chega a ser rebatido na peça. O PDT afirma que o caráter falso das afirmações já tinha sido apontado pela própria Justiça Eleitoral, pelo TCU (Tribunal de Contas da União) e também por agências de checagem e veículos de imprensa.

Para o PDT, Bolsonaro cometeu abuso de poder político e uso indevido de meios de comunicação social. Entre os requisitos para condenação está a gravidade do fato apontado.

Uma das linhas da defesa de Bolsonaro foi sustentar que as falas do evento foram feitas enquanto chefe de Estado e como ato de governo, tendo o objetivo de “dissipar dúvidas sobre a transparência do processo eleitoral”. Além disso apontam que o público-alvo do evento não eram eleitores, mas pessoas sem cidadania brasileira.

Em janeiro deste ano, o PDT pediu que fosse incluída na ação a minuta golpista encontrada pela Polícia Federal durante busca e apreensão na casa de Anderson Torres, que foi ministro da Justiça e Segurança de Bolsonaro. Tratava-se de uma proposta de decreto para instaurar estado de defesa na sede do TSE.

A defesa de Bolsonaro contestou a inclusão, argumentando que ela ampliaria o escopo da ação e que, no estágio em que o processo se encontrava (em que, por exemplo, os depoimentos das testemunhas já tinham sido iniciados), ela corresponderia à violação ao contraditório e à segurança jurídica.

O PDT, por sua vez argumentou que o documento não faz ampliação da causa da ação e que ele “serve de prova para trazer mais indícios aos fatos essenciais já delimitados”.

Em decisão já referendada pelo plenário do TSE, o corregedor-geral eleitoral, Benedito Gonçalves, que é relator das ações de inelegibilidade, considerou que o documento se conecta às alegações iniciais.

Segundo pessoas próximas a ministros, o indicativo é o de que ainda neste semestre deva ocorrer o julgamento de uma das ações, antes da aposentadoria do ministro Ricardo Lewandowski, em maio, e da entrada de Kassio Nunes Marques no TSE, ministro indicado ao Supremo por Bolsonaro.

Sobre os ataques ao sistema eleitoral, além da do PDT, há ainda uma outra ação apresentada pela coligação de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Uma das diferenças é que ela faz um recorte bem mais amplo, dando destaque a episódios que ocorreram desde cerca de um ano antes da eleição, como o vazamento de inquérito da Polícia Federal que investiga ataque hacker ao TSE, sendo a reunião com embaixadores um entre vários fatos.

De acordo com Volgane Carvalho, secretário-geral da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político), uma ação mais ampla é uma estratégia jurídica que leva em consideração entendimento do TSE sobre reconhecimento de abuso “por conjunto da obra”.

“Eu tenho pequenas condutas que sozinhas não produzem o efeito, mas, quando eu olho no macro, a sucessão delas, elas têm capacidade de produzir esse efeito”, diz Carvalho. “Só que aí ela tem um custo. Como ela fica muito ampla, torna o processo mais complexo e vai se arrastar por bem mais tempo”, diz.

A ação do PT pede compartilhamento de provas de inquérito do STF e de inquérito administrativo do TSE, e tem outros sete políticos como alvos da ação, para além de Bolsonaro e seu candidato a vice Braga Netto –entre eles estão Flávio e Eduardo Bolsonaro.

A coligação também solicita que o próprio Bolsonaro seja intimado a prestar depoimento.

Entre ações com escopo de menor amplitude, há, por exemplo, três que miram os discursos de Bolsonaro no 7 de Setembro e também em viagem para o funeral da rainha Elizabeth 2ª. Em cada caso é preciso delinear a gravidade do episódio.

Há ainda uma outra ação da coligação de Lula que toca na questão dos ataques ao sistema eleitoral, mas junto de vários outros temas relacionados a desinformação e um número maior de alvos.

Uma outra ação mais ampla, mas que foca apenas Bolsonaro e Braga Netto, trata do chamado “pacote das bondades”, incluindo aumento do Auxílio Brasil. Neste caso, porém, há maior número de pedidos de produção de provas.

A advogada eleitoral e professora Marilda Silveira afirma que, mesmo depois que um dos processos seja julgado, as demais ações não perdem seu objeto. Não há um prazo limite para o julgamento.

“Embora, entre aspas, não tenha efeito prático, todos os processos serão julgados e, se for o caso, ele [Bolsonaro] vai ser condenado ou absolvido mais de uma vez”, aponta ela, que assina uma das ações apresentadas por Soraya Thronicke (União Brasil-MS), que é senadora e concorreu à Presidência.

AÇÕES CONTRA BOLSONARO NO TSE

A reunião com embaixadores em 18 de julho é objeto de uma das várias ações protocoladas contra o ex-presidente da República na corte eleitoral e que podem torná-lo inelegível. 

Bolsonaro é acusado de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação social, por atacar, sem provas, a lisura e a credibilidade do sistema eleitoral em uma reunião oficial de governo, dentro do Palácio do Planalto e transmitida pela TV Brasil, estatal que integra a EBC. 

O ex-presidente também responde a outros 16 processos na corte eleitoral, com acusações de abuso de poder político e econômico e uso indevido dos meios de comunicação social no pleito contra Lula, que saiu vencedor.

As ações tramitando na corte organizadora das eleições independem de foro especial, ou seja, o TSE continua julgando os pedidos mesmo após a saída de Bolsonaro do Planalto.

Segundo a Lei da Ficha Limpa, em vigor desde 2010, tanto o abuso de poder político quanto o econômico são condutas ilícitas que provocam à inelegibilidade de um candidato por oito anos. 

Ainda sobre o possível abuso de poder político pelo então mandatário, uma das ações cita a intensificação de abordagens em estradas no segundo turno feitas pela Polícia Rodoviária Federal, a maioria no Nordeste, descumprindo decisão do ministro Alexandre de Moraes. 

Outro pedido, feito pela campanha de Lula, questiona a concessão de benefícios sociais às vésperas da eleição. São citadas a antecipação do pagamento do Auxílio Brasil e o Vale-Gás, além do aumento no número de beneficiários e a liberação do crédito consignado dos programas.

Um outro processo pede a inelegibilidade de Bolsonaro por realizar atos de campanha nas dependências do Planalto e do Alvorada, afirmando que encontros com governadores, deputados federais e celebridades em apoio ao então presidente desvirtuaram a finalidade pública dos prédios. 

O ex-chefe do Executivo, porém, pode se beneficiar da saída nos próximos meses de alguns ministros da corte eleitoral, como Ricardo Lewandowski, que será substituído por Kassio Nunes Marques, indicado durante seu mandato.

Composição atual e data de saída dos ministros no TSE:
 

Alexandre de Moraes – saída em 3.jun.24
 

Ricardo Lewandowski – saída em 10.mai.23
 

Cármen Lúcia – saída em 25.ago.24
 

Raul Araújo Filho – saída em 6.set.24
 

Benedito Gonçalves – saída em 9.nov.23
 

Sérgio Silveira Banhos – saída em 17.mai.23
 

Carlos Bastille Horbach – saída em 18.mai.23

Fonte: BN

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